Mais gastos deverão ser eliminados ainda que mudanças na Previdência sejam aprovadas
Por Agência O Globo - Mesmo que a reforma
da Previdência seja aprovada, como seus efeitos virão apenas a longo prazo, o
governo terá de cortar ao menos R$ 300 bilhões em outras despesas orçamentárias
nos próximos dez anos para cumprir o teto de gastos em votação no Congresso —
que já deve vigorar em 2017 — e, assim, fechar o rombo previdenciário do país.
Segundo estudo técnico da Consultoria de Orçamento da Câmara dos Deputados, com
base em projeções oficiais, as despesas com benefícios previdenciários somarão
R$ 8,441 trilhões até 2026 — montante que teria de cair para R$ 6,297 trilhões
com a aplicação do novo limite para as despesas públicas. Ou seja, em valores
reais (de hoje), é uma diferença de R$ 1,328 trilhão: montante superior ao
impacto estimado pelo Executivo para a reforma da Previdência, na casa de R$ 1
trilhão no período.
Ainda assim, essa conta
vai depender do alcance da proposta de emenda constitucional (PEC) a ser
enviada ao Congresso e do resultado da votação. A estimativa do governo
considera uma reforma abrangente, que buscará a convergência de regras para
todos os trabalhadores. O texto será encaminhado assim que o Executivo fechar e
der início a uma ampla campanha de esclarecimento à sociedade sobre a
necessidade das mudanças, disse ao GLOBO um ministro da equipe econômica.
Enquanto isso, o foco é a conclusão da votação da PEC do teto do gasto público
— prevista para 13 de dezembro no Senado.
Se a reforma da
Previdência não é suficiente para cobrir a despesa com benefícios ao longo da
próxima década, sem ela, seria o caos, argumenta uma fonte do governo. Técnicos
da equipe econômica preferem, inclusive, não vincular a necessidade de mudanças
nas regras da aposentadoria à implementação do teto do gasto público, sob o
argumento de que o regime não tem sustentabilidade, diante da trajetória
explosiva das despesas.
— Ademais, quanto menor
é o impacto, mais necessária é a reforma — destacou uma fonte do governo.
O levantamento técnico
reforça que o aumento dos gastos com a Previdência — acima da inflação nos
próximos anos — pressionará as demais despesas e tornará o teto inviável, se não
houver uma reforma. Por causa do envelhecimento da população, o dispêndio com
aposentadorias vem apresentando crescimento vegetativo acima de 3% ao ano,
destaca o estudo. Além disso, a política de reajuste do salário mínimo (que
permite ganhos reais) funciona como outro fator de pressão, pois o cálculo da
aposentadoria é feito pela média dos 80% maiores salários de contribuições e,
como houve aumento do salário médio nas duas últimas décadas, a tendência é que
os novos benefícios tenham valores superiores aos pagos atualmente. E cerca de
62% dos benefícios são equivalentes ao piso nacional, no regime geral.
IMPACTO MAIOR A MÉDIO E
LONGO PRAZOS
A previsão é que o teto
de gastos dure 20 anos — podendo ser revisto após dez anos de vigência do novo
regime. A proposta limita o crescimento das despesas totais do governo à
variação da inflação do ano anterior. É exatamente na primeira fase do teto de
gastos que estarão em pleno vigor as regras de transição da reforma da
Previdência e que tendem a ser mais leves para os trabalhadores mais próximos
da aposentadoria: homens (50 ou mais) e mulheres (45 anos). Neste caso, a ideia
é permitir se aposentar pelas regras atuais, pagando pedágio de 50% sobre o
tempo que faltava para requerer a aposentadoria.
Há também a questão dos
direitos adquiridos (pessoas já aposentadas e que não serão afetadas) e o fato
de que as regras mais duras, como corte no valor da pensão e proibição de
acumulação de benefícios, como aposentadoria e pensão, valerão somente nas novas
concessões. Por isso, os efeitos da reforma são menores no início de vigência
das novas regras, com impacto maior no médio e longo prazos.
Ainda que a reforma seja
aprovada no ano que vem, será preciso cortar R$ 26 bilhões (em valores reais)
das despesas orçamentárias de outras áreas em 2017. Em 2018, a estimativa é de
R$ 43,4 bilhões, de acordo com o estudo.
Para o especialista
Leonardo Rolim, membro da consultoria do orçamento, o efeito mais amplo da
reforma virá com as regras permanentes (mais duras), com fixação de idade
mínima de 65 anos para todos os trabalhadores (homens e mulheres, dos setores
público e privado). Porém, a reforma terá de imediato um papel fundamental na
reversão de expectativas, contribuindo para estimular o crescimento, reduzir juros,
gerar empregos e receitas e reduzir o endividamento público.
— A reforma não vai
resolver todo o problema de contenção de despesas. Porém, ela é básica para
equilibrar as contas públicas — destacou Rolim.
O economista Paulo
Tafner mencionou também os efeitos dinâmicos da reforma, ao abrir espaço para a
economia crescer além das previsões. Com isso, destacou, a receita tributária
deve crescer mais, o que vai ajudar o governo a acomodar as despesas, no novo
regime fiscal. Para ele, já há certo consenso na sociedade e entre os
parlamentares de que o sistema exige ajustes e não suporta mais as
aposentadorias aos 50 anos de idade.
— A própria reforma tem
medidas para aumentar a receita ao exigir que as pessoas passem mais tempo
contribuindo para a Previdência. Isso vai permitir elevar a arrecadação e
reduzir gasto — disse Tafner.
DESPESA COM BENEFÍCIOS
ASSISTENCIAIS
Para o especialista em
contas públicas Fábio Giambiagi, ainda que o governo consiga aprovar uma
reforma adequada no próximo ano, haverá necessidade de novas mudanças para
atender o fluxo de despesas com aposentadorias no futuro:
— A reforma será
adequada e bastante rigorosa em relação às condições de aposentadoria de 2032
em diante, mas será, provavelmente, insuficiente para lidar com o fluxo de
aposentadorias dos próximos anos. Minha impressão é que o governo eleito em
2018 talvez tenha que fazer outra reforma referente às condições de
aposentadoria na década de 2020.
Segundo um interlocutor
do Planalto, antes de enviar a proposta ao Congresso, o presidente Michel Temer
negociará com os governadores medidas a serem incluídas na PEC para ganhar
apoio e ajudar a aliviar a crise fiscal nos estados como, por exemplo, o
aumento da alíquota de contribuição de 11% para 14% para os servidores. Pretende
ainda costurar apoio explícito às mudanças com as entidades representativas do
setor produtivo.
O estudo técnico da
Câmara também chama a atenção para o crescimento de outras despesas
obrigatórias como benefícios assistenciais concedidos a idosos, seguro-desemprego
e abono (PIS) — que podem prejudicar o cumprimento do teto do gasto público.
Segundo o levantamento, dentro de dez anos, estes gastos vão atingir R$ 1,665
trilhão. O valor teria que baixar para R$ 1,242 trilhão no período. Diante do
quadro, técnicos da equipe econômica buscam alternativas para reduzir o peso
desses benefícios.
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